É uma pena, o grupo não existe mais. Trabalho, faculdade, trânsito, distância, vida…
Cada um com projetos novos foram para locais diferentes. Mas agradeço a esses singelos palhaços por terem me oferecido em poesia e interpretação, um momento tão singular.

Flores que Brotam com a Arte.

Por Pedro Moraes

“Os palhaços vão valsando no mundo, lutando com todas as armas da arte, simples mancebos bastardos destarte, vão esbarrando em esquizóides bailando (…) Vai a humanidade dançando errado, de modo que contra a dança vigente, vão os palhaços com a arte contra dançando” (Frag. A valsinha dos Palhaços, Davi Nunes).

Abram as cortinas. Vou apresentar para vocês “As Flores Mortas do Palhaço”, um grupo artístico que mistura em um grande liquidificador cultural teatro, poesia, conto e música. Não será surpresa encontrar Davi Nunes, Glauber Albuquerque, Beta e Raphael Labussiere, produzindo arte em um bar, casamento, show, faculdade, manicômio ou praça. Espera ai, Manicômio? Isso mesmo, por mais “louco” que possa parecer, foi no maior centro de reabilitação mental da cidade, o Juliano Moreira, que esses jovens artistas demonstraram uma de suas mais belas veias artísticas, o teatro.Teatro02
O público permanecia sentado, porém inquieto, sedado, mas com o olhar voltado para o palco. Dividido em dois grupos, os internos colocaram seus sentimentos em sintonia com a doce e calma “Valsinha dos Palhaços”, dedilhada em versos “os palhaços vão valsando no mundo” e recitada em acordes, “lutando com todas as armas da arte”, lá estava Davi Nunes, mostrando sua obra e puxando a fila de amigos artistas. Com os rostos pintados, a confraria artística estava reunida, interpretando uma peça de Raphael e recitando além de outros poetas o bom e velho Raul Seixas.
O grupo conquistou a interação dos pacientes, que responderam com gestos, versos e canções. Ao convidar o público para o palco, várias surpresas apareceram. Raphael impressionado diz que “uns subiram no palco e cantaram músicas populares. Teve um interno que pegou o violão e começou a tocar, as posições das notas estavam corretas, o som não saia muito bom porque ele se tremia, eram os efeitos dos remédios. Nos trouxeram também uma poesia que eles fizeram, falava sobre o dia-a-dia de um hospício, parece que alguns médicos só enxergam eles como loucos, não como pessoas”.
“Se todo artista é louco e vocês também são artistas, vamos ser loucos juntos”. Depois da declaração, Glauber, intérprete do vilão da peça, tirou a roupa juntamente com os outros artistas, por baixo, para a surpresa dos internos estava a farda do hospital. Eufórico, um dos internos gritou: “É do Juliano!” a maioria da platéia sorria e a alegria tomou conta do espaço. “Esse não foi o único momento que nos emocionou”, comenta Glauber, “quando estava no palco recitando uma poesia olhei para os olhos de uma paciente. Ela vibrava com o texto, comovida, estava quase chorando. Tive a certeza que ela estava sentindo a poesia. Foi a maior emoção que já tive ao recitar”, conclui o poeta.
A arte após a reforma psiquiátrica é utilizada como umas das terapias mais indicadas em centros de reabilitação mental. Como reflexo, no Juliano, toda quarta e sábado é dia de cinema e no domingo acontece o projeto “tô maluco para te ver” com diversas bandas. Para a assistente social do centro, Tânia Nascimento “a criação artística fornece aos pacientes um espaço para expressão da criatividade e espontaneidade. É um modelo de tratamento que ajuda a vê-los como sujeito não como sintoma. Favorece muito na reabilitação do paciente”.
Teatro11Os artistas fundaram o grupo em 15 de agosto de 2002 com quatro pilares: arte, união, singularidade e anti-capitalismo. “Nossa intenção foi criar um ambiente onde amigos pudessem libertar seu lado lírico e poético, encontrando um lugar onde nossas verdadeiras essências fossem reveladas que é a de libertar a fantasia do ser, dando vez ao lado poético, em oposição a toda hipocrisia que percebemos nas relações sociais”, relata Glauber, um dos fundadores do grupo. Hoje, As Flores Mortas do Palhaço, se apresentam gratuitamente com a participação de integrantes que flutuam de acordo com a obra e quatro integrantes fixos (Glauber, 22, morador do Vale dos Lagos, Davi, 21, residente em Narandiba, Raphael, 21, que mora no Cabula e Beta, 21, moradora no Trobogy).
As cortinas não se fecham aqui, o trabalho do grupo é muito mais amplo. Se você está interessado em conhecer melhor ou participar desta confraria de amigos, todos os domingos, às 15h, acontece uma reunião em frente ao “monumento” Luis Eduardo Magalhães, na entrada do Parque Ecológico de Pituaçu. O contato também pode ser feito pelo site, (www.floresmortas.cjb.net) na sede do grupo (Vale dos Lagos, Condomínio Dom Bosco casa 2) ou ligando para um dos dois componentes Glauber (3232-3697) e Davi (3230-0291).

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